domingo, 14 de outubro de 2012

Questionário à minha geração



Questionário à minha geração

Que fazer quando os gritos não escorrem pelo vento
E as palavras submergem na indiferença do papel?
Que fazer quando as pedras da calçada não trepam ao cimo das mãos
E os cartazes desaprendem a cantar?
Que fazer quando o futuro se esconde detrás da noite
E às crianças apreendem os lápis de cor com que pintam seus sonhos?
Que fazer quando partem os vidros das janelas da dignidade
E as auroras deixam de tanger os seus sinos?
Que fazer quando proíbem as árvores de dar fruto
E tencionam emparedar o sol?
Que fazer quando a esperança recusa uma flor
E decretam ilegal ouvir um pássaro cantar?
Que fazer quando ao inverno sucedem estações brumosas de incertezas?
Que fazer quando o povo advém uma apática, submissa e vergada estátua de carne?
Que fazer quando o silêncio é o espelho da nossa indignação?
Que fazer quando o choro é uma pungente canção que alaga incessantemente os nossos olhos?
Que fazer quando o chão das nossas ruas carcome as solas da nossa coragem?
Que fazer quando nos estendais das nossas vivências apenas estendemos lençóis de desânimo?
Que fazer quando a nossa felicidade é uma hipoteca na mão de inexoráveis e irremediáveis impatriotas?
Que fazer quando a uma sucessão de fulcrais questões a mesmíssima resposta nos basta?
Que fazer quando a cúpula do nosso quotidiano se deteriora defronte da penumbra do nosso desleixo?
Que fazer quando a água das nossas fontes tem um travo de secura?
Que fazer quando os relógios têm percursos meândricos?
Que fazer quando a nossa opinião é uma casa às escuras?
Que fazer quando o nosso sono somente suscita insónias ou pesadelos?
Que fazer quando o nosso alento é uma moribunda sombra de lama?
Que fazer quando todos os nossos caminhos vão ter ao país de onde queremos fugir?

                                                                                                                            
dinismoura

Luxemburgo, Outubro de 2012

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